Crescem os casos de depressão em crianças

27/08/2008 16:37

  27/08/2008 - O Estado de S. Paulo    
   
  Ser criança é não ter preocupações, comer bolo de chocolate, tomar banho de chuva, brincar com os amigos. Mas essas imagens tão freqüentemente ligadas à infância no imaginário da maioria das pessoas podem ocultar uma outra realidade: nos últimos anos tem crescido o número de casos de depressão infantil. No ambulatório infanto-juvenil da Santa Casa da Misericórdia, no Rio, que oferece atendimento psiquiátrico gratuito a crianças de baixa renda desde 1995, o número de crianças com depressão aumentou cerca de 10%. Desde o início do programa, 250 pacientes com sintomas depressivos já foram atendidos por uma equipe multidisciplinar, com psiquiatras, psicólogos e fonoaudiólogos. Até novembro do ano passado, o ambulatório atendia apenas crianças com idade entre 6 e 18 anos, mas, como os sintomas depressivos estão se apresentando cada vez mais cedo, o psiquiatra Fabio Barbirato, coordenador do programa, abriu inscrições para tratar crianças de 3 a 6 anos, que hoje já correspondem a 30% do total de atendimentos. “As crianças de hoje sofrem mais pressões do que as das gerações anteriores. Elas têm de lidar com muito mais freqüência com a ausência dos pais, que passam a maior parte do dia trabalhando, com as separações - que muitas vezes vêm acompanhadas de agressões verbais ou físicas na frente dos filhos”, diz. Para Barbirato, a cobrança excessiva de bom desempenho escolar e a exigência de que as crianças cumpram uma série de regras e atividades quando deveriam estar brincando também pode ser gatilho para a depressão. Os fatores genéticos também têm importante papel no desenvolvimento de depressão. O psiquiatra calcula que cerca de 80% das crianças deprimidas tenham um ou ambos os pais com a mesma doença. Nos quadros depressivos existe um desequilíbrio entre serotonina e noradrenalina, neurotransmissores que fazem a comunicação entre os neurônios. Uma pesquisa da Universidade de Pittsburgh indica que a depressão pode estar relacionada à produção irregular do hormônio do crescimento. No estudo, ficou demonstrado que as crianças depressivas fabricavam uma quantidade inferior dessa substância, mas os pesquisadores não sabem explicar por que esse decréscimo ocorre. Dados da Associação Americana de Psiquiatria Infantil indicam que de 8% a 10% da população norte-americana nessa faixa etária tenha sintomas depressivos de diferentes graus. Barbirato enfatiza que, para reconhecer os sintomas em crianças na fase pré-escolar, os pais precisam estar bem atentos aos sinais não-verbais. Regressões motoras ou psicológicas, como voltar a fazer xixi nas calças, quando a criança já não usa mais fraldas, e ter medo repentino do escuro podem ser sinais de que algo não vai bem. USO DA LINGUAGEM Depois de passarem por uma triagem inicial, que inclui a comprovação de baixa renda, os pequenos pacientes iniciam o tratamento, que inclui consultas semanais com um psiquiatra. Os responsáveis são atendidos a cada 15 dias e, se preciso, professores da criança podem ser chamados. Uma pesquisa da fonoaudióloga e psicopedagoga Telma Pantano, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, concluiu que o trabalho conjunto entre o psiquiatra e o fonoaudiólogo, apesar de pouco difundido entre a comunidade médica, pode ser uma maneira eficiente de se lidar com a depressão infantil e os problemas de linguagem que dela decorrem. A recomendação é um desdobramento de estudo em que Telma analisou os casos de 30 crianças e adolescentes deprimidos, com idades entre 10 e 14 anos, atendidos no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas. Segundo ela, é comum que nessa faixa etária o quadro depressivo esteja associado a problemas de produção, uso e compreensão da linguagem.   

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